Talvez as pessoas não queiram, ou não
sintam atração, por fazer amizades com a mesma intensidade com que se sentem
atraídas por relacionamentos amorosos. No amor, há atrativos voltados para uma
pessoa determinada, assim como acontece no desejo sexual por pessoas
específicas. Muitas pessoas gostam da ideia de ter amigos, mas, em geral, não
percebemos, em alguém concreto, estímulos visuais tão claros que nos atraiam
imediatamente especificamente para a finalidade de amizade, como
acontece na atração amorosa ou sexual.
O que pode existir, isso sim, é um
alto grau de sociabilidade: pessoas que gostam de conversar, circular, estar em
grupo. Mas essa sociabilidade ampla não é a mesma coisa que sentir um “puxão”
forte e direcionado para transformar alguém em amigo íntimo.
No começo de qualquer relacionamento
importante — seja ele amistoso ou amoroso — a situação tende a ser um pouco
desagradável ou tensa. As pessoas não sabem bem “onde estão pisando”, têm medo
de não agradar e medo de desagradar. Essa insegurança inicial é quase regra.
Talvez por isso um aplicativo exclusivamente para fazer amizade não pareça, à
primeira vista, tão atraente. Quem entra nesse tipo de app tende a fazê-lo
movido por uma decisão mais racional (“preciso ampliar meu
círculo social”, “quero conhecer gente nova”) do que por uma motivação
intrínseca intensa, como acontece no amor romântico dos estilos Eros, Mania e
Ludos, em que a própria pessoa desejada é um forte ímã.
Aqui vale distinguir:
- há motivação
intrínseca pela pessoa, típica do amor romântico, quando alguém em
particular fascina, atrai, ocupa a mente;
- há motivação
intrínseca pela atividade, quando a pessoa vai a um grupo porque gosta
de jogar futebol, estudar línguas, tocar música;
- e há a motivação
mais racional ou planejada, quando alguém decide “preciso fazer
amigos”, mas esse impulso, sozinho, costuma ser mais fraco e menos urgente
do que o desejo amoroso.
Por outro lado, pode haver algo como
uma “simpatia à primeira vista”, tal como existe o amor à primeira vista — mas,
em geral, menos poderosa. O amor à primeira vista pode ser avassalador e
hipnotizante; já na simpatia à primeira vista, muitas vezes aparece a inibição:
a pessoa sente afinidade, mas não sabe como será recebida, e recua.
Existem, sim, pessoas carismáticas
que atraem rapidamente a atenção. Frequentemente, elas despertam admiração ou
vontade de segui-las, mais do que o impulso direto de virar amigo íntimo. No
entanto, quando esse carisma vem acompanhado de acessibilidade e abertura, ele
pode, sim, servir como porta de entrada para futuras amizades — embora, ainda
assim, raramente com a intensidade típica da paixão amorosa.
O começo da amizade se assemelha ao
começo do amor do tipo Estorge — o amor que nasce da
convivência e da familiaridade. A ligação inicial costuma não ser muito forte.
Quando a ligação é forte logo no início, isso geralmente se deve ao Capital
Inicial (o conjunto de características avaliáveis antes da
convivência: aparência, estilo, status, jeito global) ou à força do interesse
de fazer amizade com aquela pessoa em particular. Mesmo assim, essa força, em
boa parte dos casos, não é tão intensa nem tão urgente quanto as forças
envolvidas no amor romântico. Isso ajuda a entender por que um aplicativo
voltado apenas à amizade tende a gerar menos motivação espontânea do que um
aplicativo de relacionamento amoroso.
Além disso, as pessoas frequentemente
sentem falta de um relacionamento amoroso: existe uma motivação amorosa
específica e dirigida (“quero um par amoroso”). No caso da amizade, o que
muitas vezes aparece é uma sensação mais difusa: um sentimento de solidão, de
vazio, de falta de convivência. Não é automaticamente um impulso claro de sair
para “fazer amigos” — é mais um desconforto que a pessoa tenta aliviar de modos
variados.
Na amizade, o início costuma ser
mediado por um fato ou contexto que coloca os dois futuros amigos juntos. A
motivação para permanecerem em contato nasce desse fato: ambos estão empenhados
em fazer um trabalho escolar, participam do mesmo time, estão na mesma
excursão, dividem a mesma sala de aula, frequentam o mesmo curso, aparecem nas
mesmas festas. A atividade em comum mantém o contato, cria
oportunidades de conversa e, a partir daí, a ligação pode se desenvolver.
No amor, ao contrário, as pessoas
podem se encontrar com finalidades abertamente amorosas, sem precisar de um
“fato externo” que as junte. No caso dos estilos de amor com forte atração
inicial, as pessoas procuram locais para paquerar, bares e festas com esse
clima, além de aplicativos explicitamente voltados para namoros e encontros.
Pouca gente, em comparação, procura locais ou aplicativos primariamente para
fazer amizade; quando o fazem, muitas vezes colocam como justificativa a
atividade em comum (grupo de estudos, grupo de corrida, curso, hobby), e a
amizade vem como “efeito colateral”.
Portanto, no caso da amizade, parece
ser quase sempre necessário algum tipo de fato externo ou uma decisão racional
que gere motivação para persistir, mesmo quando a motivação intrínseca é fraca
ou não está claramente focada em uma pessoa específica. Sozinha, essa motivação
costuma não ser suficiente para fazer a maioria das pessoas insistir numa
aproximação puramente amistosa.
Uma solução promissora, então, seria
organizar encontros e aplicativos em torno de atividades e temas, e
não apenas da ideia abstrata de “fazer amigos”: cursos, grupos de discussão,
clubes de leitura, grupos de caminhada, eventos culturais, esportes, oficinas,
encontros em parques como o Ibirapuera ou na Avenida Paulista. As pessoas vão a
esses locais e atividades não “para fazer amizade”, mas porque gostam daquilo
que está acontecendo ali. E é exatamente essa coincidência de interesse que
cria um terreno fértil para a amizade.
Nesses ambientes, se houver um
pretexto, a abordagem se torna muito mais fácil: um cachorro fofo, uma pergunta
sobre a atividade, um comentário sobre o que está acontecendo, qualquer
elemento que funcione como “autorização” para o outro se aproximar.
Tudo isso aponta para a mesma
direção: um aplicativo para fazer amizade dificilmente funcionará de forma
direta, baseado apenas na declaração “quero amigos”. Muito provavelmente ele
precisaria ser um aplicativo para discutir algum tema, fazer algum curso,
participar de jogos, projetos, grupos de interesse ou eventos — isto é, um
ambiente centrado em atividades compartilhadas, dentro do qual as amizades
possam, então, surgir e se fortalecer.
Limitações desse texto
Apesar de descrever tendências que
parecem bastante comuns, este texto não pretende afirmar leis rígidas nem
esgotar a complexidade das amizades humanas. Há pessoas e contextos em que a
motivação para fazer amigos é forte, específica e até urgente — por exemplo, em
mudanças de cidade, lutos, separações, aposentadoria ou em grupos culturalmente
orientados à convivência. Também existem amizades de altíssima intensidade
afetiva, que se aproximam, em profundidade, dos vínculos amorosos, bem como
variações importantes ligadas à idade, gênero, classe social e cultura, que não
foram exploradas aqui. Além disso, esta análise se apoia principalmente em
observação clínica e em inferências teóricas, e não em dados empíricos
sistemáticos sobre o uso de aplicativos de amizade ou sobre padrões de
sociabilidade em diferentes populações. Portanto, o modelo proposto deve ser
lido como uma hipótese útil para pensar o tema e orientar intervenções —
especialmente no desenho de ambientes e aplicativos — e não como um retrato definitivo
ou universal das motivações para a amizade.
(Texto editado pelo ChatGPT
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