(Ilustração ChatGPT)
Tornar-se um parceiro amoroso
apropriado não exige ser extraordinário. Para que se abra a
possibilidade de nascer o amor. Não é necessário ser “o mais bonito”, “o mais
interessante” ou “o mais brilhante” da turma. Em geral, o que aumenta a chance
de nascer o amor não é possuir características admiráveis excepcionais, e
sim não ter características intoleráveis para aquela pessoa –
tanto no plano absoluto (violência, desonestidade extrema,
grosseria crônica) quanto no plano relativo (características
que diferem demais das suas próprias características:
idade, aparência, nível de escolaridade etc.).
Ou seja:
- Basta ter um capital
inicial minimamente adequado. Ter um bom grau de afinidade demográfica
(faixa etária, nível de escolaridade, contexto social etc.),
- Ter ausência de
vetos fortes: características insuportáveis para essa finalidade: enorme
diferença de idade, nível de escolaridade, valores etc.
Muita gente preenche esses requisitos
quando o alvo são pessoas do mesmo grupo demográfico. O problema não é “falta
de gente boa”; o problema, muitas vezes, é não conseguir se enxergar e
ser enxergado como parceiro amoroso adequado.
Capital inicial,
vetos e o mínimo necessário para o amor
Podemos pensar assim:
- Características
admiráveis excepcionais (beleza
muito acima da média, status altíssimo, talento extraordinário) ajudam a
acender um fascínio inicial, uma “faísca”.
- Mas, na prática, o que mais
regula a chance de namoro e casamento são:
- Semelhanças
em muitas áreas: “Gente
como a gente”.
- Possibilidade
de nascer atração romântica e sexual.
- Ausência
de características absolutas intoleráveis: violência, falta de caráter, vícios graves
sem controle, desrespeito sistemático etc.
- Ausência
de características relativamente intoleráveis: coisas que, para aquela pessoa, são “não
dá” – religião, posição política, estilo de vida, projetos de vida
radicalmente divergentes, tipos de sexualidade, postura financeira, etc.
Se não houver vetos fortes e se o
capital inicial for minimamente compatível e haver chances de nascer atração
romântica e sexual, o que passa a mandar é convivência, visibilidade e
acessibilidade. É aí que entram os papéis, a forma como a pessoa se
apresenta e se deixa perceber.
Papéis amorosos e
perda de visibilidade
Um ponto crucial:
Mesmo quando alguém teria capital inicial adequado, o papel amoroso pode
ficar invisível se outros papéis forem carregados demais:
- Só colega de trabalho;
- Só amigo conselheiro;
- Só figura profissional;
- Só a “pessoa legal” do
grupo.
Quando isso acontece, a pessoa pode
ser ótima para ser parceira, mas não aparece cognitivamente como
parceira amorosa. E aí o amor não nasce não por falta de qualidades, e sim por
falta de enquadramento e de campo de visão amoroso.
Quando a parceira ou parceiro não tem
capital inicial adequado para aquele alvo específico, o papel
amoroso já começa com pouca visibilidade e outros papéis dominam.
Quando tem capital inicial suficiente e não há vetos, é a possibilidade
e a visibilidade do papel amoroso que passam a fazer diferença.
Fazendo-se notar
sem se entregar
A questão não é “seduzir” no sentido
teatral; é aparecer como possível parceiro amoroso sem se
colocar como “já conquistado”.
Alguns pontos que contribuem para o
nascimento do interesse amoroso:
- Mover-se
no campo de visão do outro:
estar presente, circular pelos ambientes em que a pessoa está, criar
proximidade física e social.
- Usar produção
adequada (roupas, postura, cuidado com o corpo) que ressalte
positivamente seus sinais de gênero e suas qualidades.
- Apresentar comportamentos
afiliativos (aproximadores, calorosos) e apaziguadores (que
reduzem tensão e hostilidade).
- Não
se mostrar totalmente entregue, de
forma que o outro sinta que ainda há algo a ser conquistado.
- Mostrar animação com
a vida, vitalidade e saúde: rir, brincar, dançar, “jogar a cabeça para
trás e dançar” mesmo – isso comunica que a vida pulsa ali.
Ter ou criar oportunidades de
encontro é decisivo:
frequentar “paqueródromos”, lugares em que as pessoas vão para conhecer algum
pretendente, mas também ambientes em que o encontro acontece por outro motivo não
amoroso (escola, trabalho, clube, curso, viagem, projeto).
A pessoa tende a nos “comprar”
pelo valor que nos damos e mostramos ter, especialmente se percebe
que temos opções. Tudo isso aumenta a chance de que o outro nos
registre mentalmente como candidato amoroso, não apenas como
cenário de fundo.
O mito da supersedução
e da beleza excepcional
Muita gente acredita que, para
aumentar as chances de iniciar um relacionamento amoroso, o principal é:
- Ficar muito mais bonito,
- Tornar-se altamente sedutor,
- Aprender técnicas
sofisticadas de conquista.
Tudo isso pode ajudar, claro. Mas
talvez não seja o fator principal.
Se o amor dependesse de
características extraordinárias, seria preciso supor que quase todo
mundo é extraordinário, porque quase todo mundo se apaixona, desperta
paixão e se casa.
É mais razoável supor que:
- O
que bloqueia possibilidades amorosas são os vetos, absolutos e relativos.
- Uma vez que não haja vetos
fortes, bastam:
- visibilidade,
- acessibilidade,
- convivência,
- sinais de abertura e
interesse,
para que, com o tempo, surjam atração, admiração e apego.
Daí a pergunta provocadora:
O que é belo atrai, ou aquilo que passa a nos atrair por outros motivos é
que vai ficando belo?
Quando alguém se torna visível, se
aproxima, gera esperança de reciprocidade e começa a ocupar
espaço na nossa vida, tendemos a vê-la como mais bela e valiosa.
Admiração: causa ou
efeito do amor?
A admiração não precisa estar
totalmente presente no começo.
Em muitos casos:
- Primeiro a gente convive,
- Gosta da presença da pessoa,
- Ela passa a ocupar espaço na
nossa vida,
- Depois: começa a admiração
de qualidades que antes eram neutras ou pouco notadas.
As pessoas, em geral, admiram mais
seus amigos do que desconhecidos. Parceiros amorosos, em geral, veem mais
qualidades em seus parceiros do que em seus amigos. Mães tendem a ver mais
valor nos próprios filhos do que nos filhos dos outros.
Essa evidência aponta para um
mecanismo importante:
A afetividade que sentimos aumenta nossa percepção de valor do
outro.
Os erros se tornam mais desculpáveis, as qualidades ficam mais salientes, a
pessoa nos parece mais atraente.
Ou seja:
muitas vezes a admiração é produto do vínculo, e não o contrário.
Graça, fascínio e
esperança de acesso
Claro, existe o fator graça/fascínio:
uma pessoa pode, de saída, causar um impacto sensorial e emocional forte.
Funciona mais ou menos assim:
- Primeiro, há um impacto
quase sensorial: rosto, corpo, voz, jeito, estilo.
- Em seguida, surge o desejo
de que ela se interesse por nós.
- O interesse dela, se
aparece, dá uma sensação de vitória, de satisfação.
Esse processo é análogo ao que
acontece com objetos: um carro, um quadro, uma joia. Vemos algo bonito,
sentimos impacto, depois podemos passar a desejá-lo. Mas há um elemento
decisivo: esperança de posse ou de acesso.
- Se existe alguma chance
realista de acesso, o apego pode crescer.
- Se algo é absolutamente
inalcançável (um carro caríssimo, um iate de cem milhões de dólares),
podemos até admirar, mas dificilmente vamos nos apegar e
ficar ruminando aquilo.
Com pessoas, funciona igual:
Sem esperança mínima de reciprocidade ou de acesso, o fascínio
tende a se manter mais no campo da fantasia passageira do que no da construção
de vínculo.
Nem todo mundo se
casa com “o mais desejável”, mas quase todo mundo ama
Quando perguntei a pessoas casadas se
tinham se casado com a pessoa mais desejável do grupo na época do namoro e
casamento, a grande maioria disse não.
Isso é totalmente esperado. Em
qualquer grupo, há uma pequena quantidade de pessoas muito desejadas por quase
todos, e, por isso, é impossível que todos fiquem com elas – há escassez e
há escolhas mútuas entre os mais valorizados.
Mas quando perguntei se tinham se
apaixonado pelos futuros cônjuges antes do casamento, a grande maioria
respondeu sim.
Frases típicas:
“Ela me conquistou. No começo eu não a amava.
Foi se aproximando, insistiu, ficou perto, e aí eu desenvolvi meu amor por
ela.”
Isso mostra que:
- Não é preciso ser a
pessoa mais desejada do ambiente;
- É preciso, sim, não
ter vetos fortes, ser minimamente compatível, estar num raio de
visibilidade e convivência, e permanecer ali tempo suficiente para
o vínculo trabalhar.
O lugar faz o
líder; o lugar faz o amado
Nessa mesma linha de atributos construídos
pelas circunstâncias, estudos mostram que, em grupos, o líder geralmente se
senta na cabeceira da mesa, e sentar-se na cabeceira aumenta a chance de ser
percebido como líder, mesmo quando a pessoa foi sorteada para sentar-se lá.
Da mesma forma:
- Estar em posições de
visibilidade,
- Acessar lugares onde
circulam possíveis parceiros,
- Ocupá-los como alguém
viável, disponível e sem vetos gritantes,
aumenta bastante a chance de que o
papel de parceiro amoroso seja atribuído a você.
Nos casamentos arranjados, e em
muitos namoros que começaram “por conveniência”, as pessoas não começam amando.
O amor pode vir depois, com a convivência, e com isso:
- Características negativas
são relativizadas,
- Características neutras
viram positivas,
- A percepção se distorce
favoravelmente em direção à pessoa a quem estamos nos apegando.
É o mesmo mecanismo que faz a mãe ver
seu filho como “o mais lindo”, o torcedor ver o seu time como mais valoroso, o
amante ver seu amado como mais especial.
Dois caminhos, um
mesmo fundamento
Podemos resumir assim:
- Caminho
1 – Faísca inicial
- Capital
inicial adequado, sem vetos fortes,
- Há
características admiráveis mais fortes (beleza, charme, status, talento),
- Elas
produzem fascínio rápido,
- Se
houver esperança de reciprocidade e ausência de vetos, o amor pode nascer
“de cara”.
- Caminho
2 – Amor que vai surgindo
- Capital inicial adequado, sem vetos fortes,
- Convivência,
visibilidade, acessibilidade,
- Papel
amoroso vai ficando mais visível,
- Apego,
admiração e atração vão crescendo com o tempo.
Nos dois casos, o ponto central é o
mesmo:
A chance de nascer o amor depende muito mais de não haver
características intoleráveis (absolutas e relativas) e de haver visibilidade,
do que de a pessoa ter qualidades admiráveis excepcionais.
Ou seja:
para muitos de nós, o grande trabalho não é “virar alguém espetacular”, e sim:
- Escolher
e ser escolhido por alguém compatível
- Abaixar
as barreiras que
nos separam das pessoas disponíveis atrás das próprias barreiras.
- Tirar
do caminho o que é intolerável (nosso
e do outro),
- Aparecer
como parceiro amoroso possível,
- Criar oportunidades reais de convivência,
- (Texto editado com auxílio do ChatGPT)