domingo, março 12, 2017

Desapaixonamento: assumir a idealização da pessoa amada esvazia a sua magia

Quando recebo um paciente que foi rejeitado pela amada e, por isso, está sofrendo muito e não há mais esperanças de conquistá-la ou reconquistá-la, tento ajudá-lo a diminuir seu apaixonamento.
Vou descrever neste artigo uma dessas medidas: ajudar o  paciente a assumir que criou boa parte da figura da pessoa amada e das experiências que teve com ela.
Outras medidas são necessárias para produzir o desapaixonamento. Por exemplo, reassumir a vida, melhorar a autoestima, atualizar os planos e iniciar um novo amor (Ver o meu artigo “Como Apressar o Desapaixonamento”: ailtonamelio.blogosfera.uol.com.br/2016/04/16/como-apressar-o-desapaixonamento)

A idealização ajuda a disparar a paixão

Segundo Stendhal, romancista e autor de uma das teorias mais respeitadas sobre o apaixonamento, a paixão só acontece porque há uma boa dose de admiração da parceira. A admiração é, em grande parte, fruto da idealização da parceira. Aquela deusa que o amado vê é, em boa parte, fruto da sua imaginação.
Stendhal usou o nome “cristalização” para se referir ao processo de idealização: observou gravetos que caiam em uma mina de sal na França. Depois de certo tempo, o sal aderia aos gravetos e, assim, eles ficavam parecidos com joias cravejadas de brilhantes. Analogamente, aquelas maravilhas que os amantes sempre veem nas amadas são, em grande parte, apenas gravetos cobertos de cristais de sal.

A idealização faz parte do amor

O amor também acontece porque a pessoa amada é idealizada. Uma pesquisa verificou que as avaliações que a pessoa amada recebe por parte de quem a ama são mais positivas do que aquelas avaliações realizadas pelos amigos dessa mesma pessoa. É importante notar que os amigos já avaliam a pessoa positivamente. Ou seja, o amor produz uma distorção ainda maior do que a amizade em favor da pessoa.

Assumindo o amor, mas não a pessoa amada

Marcel Proust, o grande escritor francês, autor de livros como “Em Busca do Tempo Perdido”, ia mais longe ainda: não gostava que seu amor fosse correspondido. Ele queria apenas sentir os efeitos do amor e, talvez, da rejeição. Tudo isso sem o ônus do relacionamento, que poderia acontecer caso o seu amor fosse correspondido.
Quando se apaixonava e não era correspondido, ele podia curtir todos aqueles sentimentos que ficam presentes quando a paixão acontece. Por exemplo, adorava ficar em frente a casa do amado (ele era homossexual), na chuva, esperando que a cortina da sua janela se abrisse um pouquinho. Podia ser ele olhando para a rua....Que emoção! Apreciava tudo que sentia enquanto esperava!
Era isso que ele apreciava: toda aquela transformação que o amor produz: a transfiguração da realidade, aquela motivação intensa para viver, a intensificação das cores, o céu mais profundo e estrelado, o canto dos pássaros mais melodioso, as músicas de amor mais pungentes...
O fato de não ser correspondido também produz seus efeitos: a esperança contínua de um olhar mais significativo por parte do amado, a busca por um pequeno sinal de aceitação, o tom negro da baixa na autoestima porque não foi correspondido, os pensamentos trabalhando para a conquista...

Assumir totalmente a idealização da parceira e dos acontecimentos amorosos ajuda a desapaixonar

Sabe aquele amiguinho fictício que muitas crianças têm? Aquele amiguinho imaginário ou até mesmo aquele tigre de pelúcia como o do Calvin, das tirinhas dos jornais, que parece muito real e participa muito da sua vida? Pois bem, tomar ciência que a sua imaginação construiu boa parte do que se passou entre você a amada rejeitadora pode ajuda-lo a se libertar do seu amor não correspondido por ela.
Assumir de forma abrangente e intensa que boa parte do apaixonamento é fruto da imaginação do apaixonado e não dos predicados da amada contribui para o desapaixonamento.
Os sentimentos do apaixonado são muito fortes e abrangentes. É difícil combatê-los. Esses sentimentos têm algo de bom: são lembranças maravilhosas. Difícil largar deles. Ao invés de combatê-los por que, então, não agir tal como Proust, ficar com eles e, ao mesmo, tempo desvinculá-los da pessoa amada e das participações que esta teve nas experiências amorosas vividas.
Claro fazer isso, não é tão simples. A ajuda do psicólogo pode ser necessária.

A desvinculação entre as experiências amorosas e a amada produz alívio

Quando a desvinculação entre as lembranças maravilhosas e a pessoa amada já está em estágio avançado, o alívio é muito grande. Para haver desvinculação dever ficar claro que aquela imagem maravilhosa que ele fazia dela e das experiências que teve com ela, foi ele mesmo quem as criou.
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